sexta-feira, 27 de maio de 2016

EVASÃO ESCOLAR NO CONTEXTO GLOBAL

A discorrer sobre o surgimento e a evolução dos direitos humanos, os quais, interligados à democracia e à paz, formam uma tríade indissociável e interdependente Norberto Bobbio (1992), afirma que esta é responsável pela visão de que o homem tem uma dignidade intrínseca à sua condição humana e que por isso, tem direito a usufruir o que a ele é constituído e, por consequência, a existência dos direitos limita a ação do poder vigente.
Assim, a vigência de um direito constitui de forma geral, como pressuposto a existência de normas que assegurem o seu cumprimento, isto é, cada direito necessita, para sua garantia, um dever. Neste sentido, possibilitar a justiça e garantir as liberdades fundamentais do homem deve ser os objetivos dos direitos constitucionais, os quais devem existir em função da sociedade e não em função do poder vigente, e sim para que tanto o desenvolvimento individual quanto o coletivo sejam garantidos.
De acordo com Cury (2002), o direito à educação, previsto em lei, surge no final do século XIX e início do século XX na Europa. No Brasil, o ensino fundamental é tido como um direito reconhecido em 1934 e como um direito público subjetivo somente a partir de 1988. É inegável que este direito caminhe em direção à diminuição das desigualdades sociais e da discriminação, especialmente das classes social e economicamente menos favorecidas.
Ainda de acordo com Cury, como os anos passados na escola são responsáveis por uma dimensão que funda a cidadania, os países que tem politicas que visem a participação de todos nos espaços sociais e de trabalho sociais e de trabalho apresentam disposições legais que instituem a educação como um direito inalienável, pois essa participação só pode ser realizada por cidadãos.
Ao analisar a trajetória dos direitos como referencial teórico a cidadania, classe social e status, de Thomas Marshall, Cury refere que os direitos civis se estabeleceram no século XVIII, os políticos no século XIX e os sociais no século XX. Os diferentes tipos de direito são concebidos lentamente e cada direito surgido é agregado ao grupo dos anteriores e, por essa evolução lenta e gradativa, podem ser considerados como tesouros da humanidade e, por conseguinte, não écabível que alguém não tenha a possibilidade de herdá-los.
Segundo Marsall (1967, in Cury, 2002) a educação é um pré-requisito necessário da liberdade civil e, por conseguinte, um pré-requisito para o exercício de outros direitos. Podemos dizer que características pessoais não podem ser consideradas impedimentos para que o direito à educação seja desfrutado, uma vez que o direito à educação se pauta numa igualdade básica entre todos os seres humanos, igualdade essa da qual se nutrira nas teorias e nos movimentos de cidadania e de democracia do século XX.
No entanto, segundo Bobbio (1992), p, 43), o problema fundamental em relação aos direitos do homem, na atualidade não é tanto d justifica-los, mas o de protege-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas politico. Assim, justificamos a abordagem da evasão escolar na adolescência como um problema ideológico, ou seja, a concepção formulada por Althusser (1985) que a trata como um mecanismo de sujeição.
Ainda de acordo com Bobbio (1992), o direito à educação é sem dúvida um paradoxo, uma vez que para desfrutá-lo, o sujeito tem o dever de apresentar-se de acordo com os padrões pré-estabelecidos, a existência dos direitos em função da sociedade e não em função do poder vigente enunciada e ainda não teve uma aplicação cabal ao menos no que diz respeito a execução desse direito. Podemos observar semelhanças com a conhecida frase do livro A Revolução dos Bichos (CORWELL, 1945), que enuncia: “Todos são iguais, mas uns são mais iguais que os outros”.
Diante de uma análise generalizada dos aspectos que mais evidenciam o contexto educacional global e dos resultados que se espera desse processo que muitos pesquisadores definem como sendo de transformação social verificaremos que humanidade vive, hoje, um momento de sua história marcado por grandes transformações em muitas áreas do conhecimento, da produção e particularmente no eu se refere a produção cientifica e cultural.
Esses aspectos do avanço do conhecimento carregam consigo a necessidade de redimensionamento das práticas mediadoras da realidade histórica educacional voltada para a preparação para o trabalho e para os desafios impostos nesta nova sociedade. Assim a educação, como fator de transformação e como ação mediadora dessas práticas é colocada no campo das discussões como o modo mais eficaz de contribuir na construção da cidadania, agindo fundamentalmente na construção do homem social.
Vale apenas considerar também o processo educacional sistematizado de intervenção na dinâmica social e da vida das pessoas é fator preponderante para o desenvolvimento integral das sociedades. Porém, os processos sociais e educacionais não se restringem apenas a essa funcionalidade operatória. A significação desses processos só ganhará legitimidade se ultrapassarem a barreira da teoria e tornar-se visíveis no campo das ações práticas na vida das pessoas.
No contexto das generalizações, abordar reflexivamente a educação no cenário histórico e mundial não é simplesmente dispensar os dados e análises que as ciências especializadas nesse campo do conhecimento podem trazer. Faz-se necessário considerar todos os fatores que permeiam a educação na atualidade e da sua relação com a sociedade como forma de concebê-la pela ressignificação do seu papel na vida das pessoas e da condição humana.
Nesse sentido, para Brandão (2001), o desenvolvimento da educação está intrinsicamente ligado ao desenvolvimento da própria sociedade, que é constituída pelos seres humanos. Considerando essa perspectiva, os seres humanos não se desenvolvem de forma natural e espontânea, mas através da educação, constituída como um bem cultural e social. Portanto, a educação, pode ser compreendida também como processo ontológico da constituição humana que produz sentidos, criando e recriando significados de ser e estar no mundo.
Ao criar e recriar significados a condição humana admite-se dizer que a educação é uma experiência antropológica que submete à aprendizagem, da constituição humana, como afirma Charlot (2000, p. 53),

Aprender para construir-se, em um triplo processo de “hominização” (tornar-se homem), de singularização (tornar-se um exemplo único de homem), de socialização (tornar-se membro de uma comunidade, partilhando seus valores e ocupando um lugar nela). Aprender para viver com outros homens com quem o mundo é partilhado. Aprender para apropriar-se do mundo, de uma parte desse mundo, e para participar de um mundo pré-existente (CHARLOT, 2000, p. 53).

A educação escolar presente na cultura do homem atual exerce a função de socialização, bem como de humanização das pessoas e diante da sua complexidade deveria ter sempre como meta emitir respostas eficazes às necessidades das sociedades contemporâneas, resultantes das demandas que lhes são impostas, na perspectiva de preparar para o aqui e agora, bem como para o futuro com uma visão mais clara de um mundo e um futuro pessoal (STOBÃUS E MOSQUERA, 1991, p. 2.).
No cenário global, a escola por ser compreendida como espaço institucional de difusão do conhecimento historicamente sistematizada pela sociedade surge como instituição pública, laica e gratuita no contexto da modernidade, tendo como um dos deveres a transmissão e o ensinamento dos fundamentos da ciência como descreve Sposito (2005, p.10):

A disseminação da escolaridade seria uma das expressões mais claras do processo modernizador, embora este mesmo fosse analisado em suas ambigüidades, ou seja,  como forma inacabada de uma sociedade que ainda mantinha seus vínculos com a ordem oligárquica agrária e escravocrata, mantida por instituições pouco sensíveis e permeáveis aos intensos processos de mudança que se situavam na junção dos fenômenos da industrialização e da urbanização (SPOSITO, 2005,p.10).

Historicamente o iluminismo marca a trajetória do projeto pedagógico moderno, no qual a educação passou a ser o foco, por excelência, das expectativas e esperanças da humanidade, partindo da concepção de um individuo bem educado seria a certeza ou da mesma forma poderia contribuir para a determinação de um mundo melhor. Diante de tais pressupostos a educação passou a admitir como tarefa fundamental educar para o aperfeiçoamento moral da humanidade, a incorporação ao mundo do trabalho, a intervenção na vida, surgindo, assim, o sujeito escolar.

Assim, pode-se dizer que os processos de escolarização modernos e contemporâneos estão relacionados sobremaneira com os processos civilizatórios, que incluem a adaptação do indivíduo à sociedade atual, a partir da sua origem social, histórico e em longo prazo, com mudanças lentas e graduais. Portanto, a formação individual de cada pessoa depende dos padrões sociais que foram se estabelecendo ao longo da história e das estruturas das relações humanas.  

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