A região do baixo Rio Madeira na Amazônia caracteriza-se por apresentar
um conjunto de comunidades tradicionais que sobrevivem da agricultura e do
extrativismo vegetal e animal. Atualmente, contam com geração e distribuição
pública de energia, linha telefônica, televisão com recepção via antena
parabólica. Posto de saúde instalado na sede de cada distrito apresenta
condições satisfatórias nos aspectos físicos, se comparado aos demais da
região. Um grande desafio dos habitantes corresponde à falta de profissionais
qualificados para atender suas necessidades básicas.
Distrito de Nazaré/Rondônia. Fonte: https://www.diariodaamazonia.com.br/festa-da-melancia-no-distrito-de-nazare-em-porto-velho/
A água consumida é captada diretamente do rio através de bombas elétricas ou de poços semiartesiano. A má qualidade gera muitos problemas de saúde, especialmente na época em que o nível do rio Madeira começa a subir, e do mesmo modo, quando começa a descer. O atendimento educacional é regular. As escolas possuem estrutura física satisfatórias e conta com professores especializados. Nas sedes dos distritos a população conta com o ensino fundamental e médio.
Organizados em associação, os produtores realizam festas tradicionais,
festejos de Santos em várias épocas do ano que atrai centenas de
pessoas. Para Almeida (2008), a repetida inovação de modernidade e
progresso, que parecia justificar que os agentes sociais atingidos pelos
grandes projetos fossem menosprezados ou tratados etnocentricamente como
primitivos e sob o rótulo de atrasado, tem sido abalado face à gravidade de
conflitos prolongados e à eficácia dos movimentos sociais e das entidades
ambientalistas em impor novos critérios de consciência econômica e ambiental.
Em meio às diversas abordagens sobre desenvolvimento, o conceito de
Desenvolvimento Sustentável, originário da economia ecológica, tem sido um dos
mais institucionalizados (RODRIGUES, 2009), através de uma proposta ideológica
muito sedutora: compatibilizar o desenvolvimento econômico, social e equilíbrio
ambiental.
Porém, para Carneiro (2005) essa discussão sobre Desenvolvimento
Sustentável em comunidades tradicionais envolve contradições com relação à
questão ambiental e as relações produtivas, quando relacionada ótica
capitalista atual de desenvolvimento. Carneiro (2005) retoma a discussão de que
o sistema capitalista é contraditório e por si só, incapaz de gerar
sustentabilidade até para si mesmo, como discutido por Marx (1963).
Nos últimos anos, o poder público, a iniciativa privada e as
organizações não governamentais têm direcionado parte de seus esforços para o
estabelecimento de estudos, ações e projetos que melhor deem conta e atendam a
valorização da cultura dos povos tradicionais. Estes esforços relacionam-se a
um desejo de entendimento para além do senso comum do problema social e ao
crescente interesse pela promoção da inclusão econômica e social desses povos,
que resistem culturalmente a milhares de anos.
Não se trata apenas de uma pesquisa voltada ao aspecto geográfico, ou
econômico. Ao entender o processo histórico de formação dessas comunidades será
possível apresentar a história econômica regional incorporando os componentes
socioeconômicos ao longo do tempo e projetar cenários e conceitos alternativos
para o futuro, de forma a se arquitetar o planejamento regional considerando
aspectos amplos de natureza geopolítica e de logística de transporte para esta
região.
Acredita-se que a partir de um trabalho de pesquisa cientifica que evidencie
a formação histórica e os processos de colonização das comunidades ribeirinhas
é possível mostrar a potencialidade econômica cultural e ambiental existente
que poderiam ser exploradas de forma especializada e equilibrada, gerando
riqueza e qualidade de vida para a população local. Dessa forma será possível
direcionar os olhares das autoridades constituídas para o incremento de
politicas eficazes que incentive os meios produtivos, sem perder de vista a
sustentabilidade cultural e ambiental da região.
A partir
do Decreto nº 6.040, de 7/02/2007, as comunidades tradicionais foram entendidas
como grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais. Possuem
formas próprias de organização social, ocupam e usam territórios e recursos
naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa,
ancestral e econômica, utilizando ainda conhecimentos, inovações e práticas
gerados e transmitidos pela tradição e não apenas meros transmissores dos modos
de vida na beira do rio (OLIVEIRA, 2009).
Concernente
aos conhecimentos adquiridos por estes povos ao longo dos anos, Boff (2004)
exclama: “o conhecimento tradicional é uma sabedoria feita da observação e da
ausculta da Terra”. Esses ainda são determinantes para a manutenção do
equilíbrio existente entre estas populações e a natureza; já que sua
sobrevivência depende da manutenção dos recursos naturais.
A disputa
pela apropriação dos conhecimentos acumulados ao longo de várias gerações se dá
inclusive em nível internacional: “No plano internacional, a biodiversidade
tornou-se objeto de intensa disputa e extrapola o campo dos recursos
biológicos, da agricultura e da alimentação, pois o campo de luta não é mais a
apropriação do território em si, mas o acesso e o controle do conhecimento. O
que está em jogo é a defesa do direito de continuar mantendo uma conexão vital
entre a produção de alimentos e a terra. Impossível proteger a diversidade
biológica sem proteger, concomitantemente, a sociodiversidade que a produz e
conserva. [...]”. (CASTRO, 2000).
Para
Costanza (1991), sustentabilidade é “a relação entre os sistemas
econômicos humanos dinâmicos e os sistemas ecológicos mais abrangentes,
dinâmicos, mas normalmente com mudanças vagarosas, na qual: a) a vida humana
possa continuar indefinidamente, b) as individualidades humanas possam
florescer, c) a cultura humana possa desenvolver, d) os efeitos das atividades
humanas permaneçam dentro de limites a fim de que não destruam a diversidade,
complexidade e funções do sistema ecológico de suporte da vida”.
As
comunidades tradicionais contribuem, ainda, para a conservação do equilíbrio
ecológico, pois na maioria das vezes tais povos reconhecem a natureza como ser
vivo sagrado. Dessa forma eles respeitam, cuidam, valorizam e convivem em
harmonia. Quanto ao papel das comunidades na conservação da biodiversidade,
Oliveira (2009) bem relata: “culturas e saberes tradicionais contribuem para a
manutenção da biodiversidade dos ecossistemas. Em numerosas situações, na
verdade, esses saberes são o resultado de uma evolução conjunta entre as
sociedades e seus territórios, o que permitiu um equilíbrio entre ambos”.
A
inclusão social, sendo entendida não como desenvolvimento de políticas públicas
assistencialistas, mas como geração de políticas participativas que permitirá a
essas comunidades se tornarem agentes em seu processo de inclusão e integração
social. Por sua vez, a inclusão social, para além de uma maior acessibilidade,
almeja o desenvolvimento de ações que tenham impacto político, social e
econômico ao alcance de todos em longo prazo. Para Abramo (2007), as políticas
públicas com esses aspectos seguiram o caminho das pesquisas somente
recentemente.
A
concepção de Abramo (2007) nos permite entender o ser humano como sujeito
dialógico, capaz de contribuir para a solução de problemas e requerente de
necessidades específicas. A partir desta visão, se faz necessário estudar e
compreender o processo histórico de colonização e identificar as
potencialidades econômicas das comunidades localizadas na região do baixo Rio
Madeira, pela sua diversidade econômica, cultural e ambiental que tem alcançado
olhares das autoridades políticas dento e fora de Rondônia, nos últimos anos.
A atenção das autoridades precisa ser transformada em infraestrutura que poderá ser associada ao sistema produtivo local se este for diagnosticado e colocado à apreciação com fontes confiáveis que apontem as melhores perspectivas de investimentos. Acredita-se ser de suma importância para o campo da pesquisa a observação detida das ações que rumam em direção contrária a grande maré que toma as populações tradicionais como problema, desejando ofertar a eles o direito de expansão das esferas de seu ser por meio do desenvolvimento das suas diversas potencialidades (COELHO, 2008).