sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Educação em regiões ribeirinhas da Amazônia

 A Região denominada baixo Rio Madeira, no Município de Porto Velho/RO, formada pelos Distritos de São Carlos, Nazaré, Calama e Demarcação é constituída por uma variedade de ecossistemas e biodiversidades e abrange uma área de 7.833,85 km². 

Possui uma diversidade de povos com saberes, habilidades, costumes e valores próprios que torna a região um espaço inter/multicultural, com populações cujas diversidades cultural, social e étnica sustentam a sua riqueza sócio histórica. Sua população contabiliza cerca de 5.957 habitantes, distribuídos em 1.421 domicílios (IBGE, 2010). 

A escola que nasce e se desenvolve nessa região possui extrema importância para a reprodução social das populações ribeirinhas (FABRÉ, et al, 2007). Apesar da peculiaridade e riqueza dessas localidades, marcada pela subida e descida das águas, a política educacional tem sido predominantemente pautada no modelo urbano-cêntrico. 

Via de regra tem reproduzido fortemente a desvalorização do modo de vida, reforçando o êxodo rural e consequentemente a falta de desenvolvimento socioeconômico e cultural da região.

 Discutir o modelo educacional que historicamente se tem levado às regiões ribeirinhas de Rondônia, cujo isolamento sociopolítico e cultural dessas comunidades as tornam singular, e merecedores de uma escola que desenvolva políticas educativas diferenciadas, a partir de um currículo que evidenciem as competências e habilidades dos estudantes alinhadas com as potencialidades locais, é uma necessidade urgente.

Pensar o espaço das comunidades ribeirinhas na Amazônia significa superar visões estereotipadas dos significados do que é viver essa múltipla identidade, marcada por diversos aspectos, que vão da relação com a natureza à construção da vida nas práticas do cotidiano definidas pelas cheias e vazantes dos rios. 

A quase inexistência, de atenção governamental é amplamente perceptível, particularmente no que se refere à garantia dos direitos sociais, como a oferta de um modelo educacional que atenda as peculiaridades locais com qualidade. 

São crianças e jovens que têm suas vidas inseridas num modo peculiar de viver, trabalhar e estudar. Muitas dessas crianças já começam a lidar com a pesca e a agricultura desde muito cedo, participando dos fazeres e do sustento diário de suas famílias. 

A invisibilidade carregada consigo, proporciona a inexistência de uma política educacional que tenha como base o desenvolvimento humano, com currículos centrados na aprendizagem ativa e reflexiva que vise o desenvolvimento de cidadãos capazes de responder de forma autônoma as transformações advindas do processo de globalização. 

Percebe-se que o atendimento educacional em comunidades ribeirinhas do baixo Madeira, no Município de Porto Velho não dispõe de um planejamento efetivo e reflete o modelo urbano cêntrico, sem dar importância aos interesses da população local. 

Trata-se de uma estrutura advinda da imposição social, na qual os padrões educacionais, culturais, didáticos e institucionais urbanos são transpostos para as unidades educacionais rurais, deixando de explorar as potencialidades econômicas, sociais e culturais vividas pelos educandos, no local onde vivem. 

As análises realizadas em documentos existentes nos sistemas educacionais municipais e estaduais, como Proposta Curricular, Programa Formação de Professores, Calendário Escolar, entre outros voltados para o desenvolvimento da educação no município, não apresentam propostas que respeite as diferenças e características enquanto escola que abriga um outro modo de viver as relações pedagógicas e cujo currículo precisa voltar-se para suas necessidades cotidianas. 

Mesmo a Lei nº 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB, conceber que na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino deverão promover as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente quanto aos conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos, organização escolar própria, incluindo adequação do calendário às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas e adequação à natureza do trabalho na zona rural, tais condições ainda não se tornaram reais nas escolas ribeirinhas. 

Persiste no universo educacional ribeirinho uma dicotomia em pensar no aluno que se quer formar quando a sua educação escolar não reflete o seu modo de viver e de se organizar no contexto do ambiente onde vive. 

Neste contexto é salutar refletir na importância das escolas e da educação no ambiente ribeirinho, não somente pelas difíceis condições de acesso, precariedades físicas, dinâmica dos rios e trabalho do professor, mas sobretudo pela transformação que a mesma é capaz de gerar e influenciar no desenvolvimento das pessoas.

Há a necessidade de repensar as práticas e os conceitos pedagógicos desenvolvidos nas escolas ribeirinhas. Para isso, sobrepõem-se como condição primeira que os saberes tradicionais, as crenças e a cultura dessas populações sejam consideradas nas discussões de um projeto de escola, que inspirada na nova Base Nacional Comum Curricular traga consigo a construção de uma proposta que impacte diretamente na vida dos ribeirinhos.

Uma pedagogia diferenciada que articule o saber cultural com o saber científico despido de qualquer preconceito e que considere as peculiaridades geográficas da região, formação de professores e discussões quanto as possibilidades da formatação de um currículo por competência que valorize e almeje a aprendizagem ativa e reflexiva dos alunos em uma escola com outro modo de viver

A Geografia no Brasil

Como conteúdo curricular, a Geografia só se fixa nas unidades escolares e nos seus currículos a partir de 1837, com a criação do Imperial Colégio Pedro II. Nesse período, o ensino público brasileiro passou por diversas alterações com a adoção de diferentes modelos, como o Método de Lancaster, uma forma do sistema atingir o maior número de pessoas possíveis com uma verba reduzida, enfraquecendo o processo de desenvolvimento cognitivo dos estudantes e reduzindo de forma significativa os investimentos destinados à educação pública.

De acordo com Pessoa (2007), no mesmo século, ocorreram quatro grandes reformas no sistema educacional brasileiro, que afetou diretamente o ensino de Geografia e a forma que ela era exposta para os estudantes. A primeira reforma, planejada por Benjamim Constant (1890), a segunda por Epitácio Pessoa (1901), a terceira por Rivadávia da Cunha Corrêa e a quarta e última grande reforma por Carlos Maximiliano (1915).

A partir desse período, surgem vários cenários em relação ao ensino de Geografia no país, influenciado pelos mais diversos aspectos de cunho econômico, territorial e social. O ensino de Geografia foi normatizado e democratizado efetivamente no sistema público e privado a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB, Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996 (BRASIL, 1996).

Em 1997, sob a edge da Lei supramencionada, o Ministério da Educação publicou os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, um documento que objetifica normatizar e categorizar o processo de ensino nacional (BRASIL, PCN, 2000, p. 15).

De maneira geral, a Geografia enquanto disciplina nos currículos escolares, sempre foi tratada de forma simplória e condensada, seja pelo método utilizado ou mesmo para não proporcionar a formação crítica do cidadão. Foi somente a partir da década de 1980 que as instituições educacionais começam a levar em consideração os aspectos socioculturais e socioespaciais para suas análises, visando um ensino crítico, criativo e com maior qualidade.