A
nucleação escolar que vem sendo materializada pelos gestores
governamentais ainda faz parte do ajuste das políticas educacionais
iniciada com a reforma do Estado na década de 1990. Tinha como uma
de suas principais finalidades incorporar o país a nova ordem
econômica mundial e estava assentada em algumas premissas como a
modernização, racionalização e privatização (SHIROMA,
2000; SOARES, 2000; DOURADO, 2001; PERONI, 2003).
Nesta
perspectiva, segundo Dourado (2001, p. 49) o mercado assume o
papel de “[...] portador da racionalização sociopolítica
conservadora, configurando-se pela minimização do papel do Estado
no tocante às políticas públicas”. Este princípio atribuiu
novas responsabilidades aos entes federados no gerenciamento das
políticas educacionais, principalmente a partir da municipalização
do ensino.
A
municipalização, na prática, representou a transferência de
responsabilidade da gestão das políticas educacionais da união aos
estados e municípios, porém, a união continuou centralizando a
formulação, assim como a distribuição dos recursos à educação.
No entanto, um dos grandes desafios dos governos era a superação
dos déficits educacionais, principalmente o analfabetismo, que de
acordo com Shiroma (2000) a taxa no
Brasil no período entre 1980/1996 chegava a 25,4%.
Estes
dados quando reportados as populações residentes na zona rural eram
mais alarmantes ainda, no ano de 2000 a taxa nacional de
analfabetismo entre as populações de 15 anos ou mais por domicílio,
representava 29,8%, entre as regiões. O Norte e o Nordeste
despontavam com as maiores taxas 29,9% e 42,7%, respectivamente
(HENRIQUES et all, 2007, p. 19).
Estes
resultados eram decorrentes de uma série de adversidade que marcaram
a história da educação ofertada às populações rurais no Brasil,
como, o atendimento educacional tardio, falta de qualificação dos
professores que refletia na má qualidade do ensino. Entretanto, um
dos grandes problemas atribuídos à educação do campo para os
gestores municipais foram e tem sido as classes multisseriadas, pois
recaem sobre elas os piores indicadores educacionais além de
funcionarem em condições precárias.
De
acordo com Moraes et all (2010, p. 405)
“[...] as mazelas que envolvem a realidade das escolas
multisseriadas são muito antigas e profundas”. Neste contexto, é
que surge a política da nucleação, como uma das principais
estratégias das secretarias municipais de eliminarem as classes
multisseriadas. De acordo com o INEP/MEC
(BRASIL, 2006, p. 116) a nucleação é “um procedimento
político-administrativo que consiste na reunião de várias escolas
em uma só, desativando ou demolindo as demais.”
Seguindo
esta lógica, Carmo (2010, p. 161)
destaca que “A nucleação consiste em construir uma escola de
grande porte em um determinado espaço geográfico, de forma que
fique centralizada e as demais do entorno seriam deslocadas para
esta”.
Este
processo tem gerado certos antagonismos, se por um lado, os governos
vêem como a possibilidade da eliminação das classes multisseriadas
formadas por turmas unidocentes que atendem em um mesmo espaço
várias séries/anos, funcionando em escolas sem estruturas adequadas
e com professores sem atendimento, projeto pedagógico e metodologias
adequadas, por outro, fere o direito à educação dos sujeitos, uma
vez que a nucleação tem significado a dizimação de muitas
comunidades tradicionais nas áreas rurais.
Também,
é necessário questionar se em função do discurso da qualidade da
educação nas escolas rurais os gestores municipais não estão
utilizando a política da nucleação para proverem a racionalização
dos recursos investidos na educação.
Imprescindível
também considera que a nucleação
neste espaço é bastante complexo pelas circunstâncias geográficas
que caracteriza a região, formada por ilhas, rios e igarapés,
assim como a peculiar
densidade geográfica de habitantes por
quilômetros quadrados. São alguns dos
fatores que gera preocupação quanto
ao
deslocamento dos alunos de suas comunidades para as escolas núcleos,
pelo tempo de viagem de barco que percorrem cotidianamente para
chegarem à escola.
Os
habitantes dessas regiões tem uma
relação intrínseca
com a natureza. Os
ribeirinhos têm nas matas e nas águas toda simbologia expressa na
sua cultura, diante de um espaço único, crítico e variadas
interpretações. A relação homem e natureza iluminam e refletem a
cultura desse povo. Para
Paes Loureiro (1995):
Trata-se
de um mundo de pescadores, indígenas, extratores consumidos em
largas e pacientes jornadas de trabalho; de uma geografia de léguas
de solidão e dispersão entre as casas e pequenas cidades, de um
viver contemplativo onde predominam a linguagem e a expressão
devaneantes, como se seus habitantes caminhassem entre o eterno e o
cotidiano.
Nesse
contexto da relação com o espaço vale considerar que as
práticas culturais são um importante componente para a produção
das espacialidades. São elas que mediam a relação do homem com a
natureza e ajudam a construir o mundo (CLAVAL, 2007). E é por ela
que os vínculos territoriais são estabelecidos, “Há assim uma
herança cultural que permeia a relação com o território”
(ALMEIDA, 2008). A tradução da cultura para o espaço passa pelo
território (BONNEMAISON, 2002).